sábado, 16 de julho de 2016

Saudade do cativeiro

 
Presa. Presa é que me sinto bem, ouviste?
Presa a ti, nas asas do nosso desejo, no voo do nosso amor picado, proibido e insano.

Comecei a sentir saudades no dia em que me libertei. 
Cortaram-me as asas quando pude voar. Pertenciam-te. Ficaram para trás.
Não pude se não rastejar o resto da vida, arrastar-me de ausências e memórias ácidas e escaldantes.
Sair de ti foi saltar para o abismo.

Custa respirar em céu aberto. Fere a luz nos olhos.
Ensurdecem-me os movimentos da vida a bulir cá fora - passos na calçada, gargalhadas de criança, vozes, burburinhos, automóveis a passar. Ensurdece-me a torrente de microfones e câmaras e flashes e perguntas, muitas perguntas, interrogações que não tinha em mim, interrogações em línguas que não entendo, mesmo quando são na minha.
Mais do que tudo, ensurdecem-me os segredos que me sopraste ao ouvido. Bloqueiam-me o raciocínio, baralham-me o destino, desfragmentam quem sou.

Presa a ti é que me sinto bem. A liberdade aprisionou-me na angústia.
Presa
a
ti.
 Agora...
 esta náusea,
 este sufoco,
esta ressaca de ti,
da tua voz, da tua pele, da tua força.
Garras que me seguram.
Pulsos que me sustentam.
Presa a ti é que me sinto bem, ouviste?
Não se é livre longe de quem se ama.
Amar é estar preso.




Síndrome de Estocolmo
estado psicológico particular em que uma pessoa, submetida a um tempo prolongado de intimidação, passa a ter simpatia e até mesmo sentimento de amor ou amizade perante o seu agressor

(O termo foi cunhado pelo criminólogo e psicólogo Nils Bejerot, que ajudou a polícia durante o famoso assalto de Norrmalmstorg do Kreditbanken em  Estocolmo (Suécia) que durou de 23 a 28 de Agosto de 1973. Quatro pessoas foram mantidas reféns por seis dias. Depois de libertadas, as vítimas continuaram a defender os raptores, mesmo depois dos seis dias de sequestro.)

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